Zylgor: A Princesa das Águas




Lu Evans
Zylgor: A Princesa das Águas



BOSQUE AZUL


O rapazinho despertou com lentidão. Sentia o corpo formigando, sua cabeça girava e zunia. À medida que piscava os olhos estreitos e escuros, começava a enxergar o cenário a sua volta. Estendido numa relva macia, ele mirou o céu de lindo tom azul claro com nuvens tão finas e escassas que assumiam a tonalidade azul do próprio céu iluminado por um radioso sol... de lindo tom azul claro.
Sentou rápido. Ainda sem querer acreditar, constatou que além do céu e do sol, tudo ali era puro azul: árvores, pedras, chão, pássaros... Tudinho azul… Ele esfregou os olhos com insistência. Aquilo de nada adiantou. Ele continuou vendo as coisas completamente azuis. Porém, reduzir o que via àquela única cor era simplificar os infinitos tons, matizes e gradações a sua volta. Índigo, cobalto, celeste, turquesa, lazúli, marinho, royal, safira... Um arco-íris de azuis.
Olhou para as mãos. “Ufa!”, suspirou aliviado. Por um instante imaginou se não estaria banhado de azul como tudo a sua volta. O momento de alívio foi breve, pois o chão trepidou, e aquilo o deixou em alerta. Quando o tremor cessou, ele se levantou. Estava um pouco tonto e sua testa latejava. Talvez tivesse sofrido uma pancada na cabeça. O que mais explicaria a enxaqueca, o bizarro efeito de enxergar tudo em tons de azul e a atrapalhação nas ideias? “Preciso de um médico, e rápido!”, pensou.
Sem saber que rumo tomar, ficou parado ali mesmo, olhando de um lado para outro, investigando o bosque azul e repetindo para si próprio: “Em que bela encrenca me meti agora!? Onde estou? Como cheguei aqui?”
Aborrecido, chutou uma pedra que foi bater nuns arbustos mais adiante. O barulho causou a revoada de pássaros azulados de caudas curtas e arrepiadas. As aves fugiram com grande alarido, entoando um chilrear agudo e assustado, e sumindo no horizonte em meio às tênues nuvens.
O garoto soltou outro suspiro, dessa vez de indecisão, e novamente olhou para os lados. Precisava fazer algo. Não podia ficar parado no meio de um bosque azul esperando o dia do juízo final.
Com passos incertos e a testa a latejar, começou a caminhar por entre as árvores de troncos finos, casca lisa e aparência encerada. Sua intenção era ir andando, não importava para que lado. Com um pouco de sorte, encontraria qualquer coisa que desse uma pista de seu paradeiro, uma estrada ou mesmo alguém a quem pedir informação.
Apesar de apreensivo pela situação tão inusitada, ele começou a se distrair com o cenário, que era bem diverso de qualquer outro que já tinha visto. Encontrou, por exemplo, flores que soavam como pequenos sinos badalando, e insetos reluzentes e de forte zumbido remexendo nos buquês e liberando um perfume adocicado no ar.
O garoto ia concentrado nas observações a respeito da natureza exótica daquele lugar quando, de súbito, foi invadido por uma inquietante sensação de estar sendo observado. Chegou mesmo a acreditar que ouviu um galho se partindo ali perto e em seguida uns murmúrios. Virou-se assombrado, o coração aos pulos, tentando localizar quem o espionava. Nada viu além das árvores, da grama rasteira, dos arbustos e das pedras.
Será que a pancada em sua cabeça estaria provocando alucinações? Aquele pensamento o deixou ainda mais preocupado. Apalpou a testa, o topo e a parte de trás da cabeça. Não sentiu qualquer coisa que indicasse ter levado uma pancada. Voltou a andar. Sentia-se um pouco cansado e o fôlego estava curto, como se o nível de oxigênio ali fosse menor. “Talvez a altitude dessa área esteja bem acima do mar”, ele pensou.
Não muito depois escutou um som conhecido e foi na direção dele. Descobriu uma tépida cascata que desaguava num rio de águas suaves, límpidas e cristalinas. A imagem da água correndo de mansinho era tão atrativa que ele caminhou até o leito de areia fina e brilhosa. Sentia muita sede. Ajoelhou-se e se curvou para beber. Depois descalçou os sapatos, tirou a camiseta e a jaqueta, despiu as calças jeans e saltou n’água. Talvez um bom mergulho ajudasse a clarear suas ideias.
Respirou fundo quando veio à tona, deu algumas braçadas, esticou o corpo e ficou boiando por uns segundos. A suavidade da água borbulhando na sua pele ia revigorando suas energias e relaxando seus músculos, que até então tinham estado rijos e tensos. Até mesmo a dor de cabeça foi amenizando.
O efeito de calma profunda produzida pela água foi quebrado quando ele ouviu um chiado. Sobressaltado, abriu os olhos e, mirando a vegetação que margeava o rio, percebeu uma leve movimentação. Se antes ele tinha tido apenas a impressão de estar sendo espionado, agora tinha a mais absoluta certeza. Sempre olhando o entorno com profunda atenção, o garoto nadou devagar até a margem do rio.
Por mais embaraçoso que a situação fosse, sua única alternativa era sair da água pelado. Com o rosto corando de vergonha, ele saltou para a margem e alcançou suas roupas. Afobado, tratou de se vestir. Com tanta presa ia colocando as roupas que acabou se desequilibrando na hora de amarrar o cordão do sapato e caiu sentado. Para piorar, ouviu uma risadinha abafada.
Levantou num pulo, e passou as mãos grandes e quadradas pelos cabelos para retirar a água que pingava nos seus olhos. Mirou em volta, os olhos escuros, apertados e inquietos, e, em voz alta e alterada, disse:
– Deve estar achando tudo isso engraçado, hem? Por que não aparece de uma vez, seja lá quem for?
Tampou a boca com as mãos tão logo concluiu sua fala. Será que estaria endoidecendo ou tinha mesmo falado num idioma muitíssimo diferente do seu? Embora não soubesse que língua era aquela, tinha a exata noção do significado das palavras bem como as pronunciava com perfeição.
A situação se tornou ainda mais enlouquecedora quando ele ouviu uma voz roufenha num tom meio divertido e desafinado cantarolando no mesmo dialeto estrangeiro.

No Bosque Sereno a luz apontou
Não se sabe quem vem lá
Mas isso não tem importância
A verdade a luz vai mostrar
A verdade a luz vai mostrar

Se o guerreiro valoroso chegar
Não haverá o que temer
O caminho ele vai mostrar
E o grande vilão deter
E o grande vilão deter

Esperança e fé trazem liberdade
Ao bravo que vencer
Será sua nossa amizade
E mais recompensas se merecer
E mais recompensas se merecer

Atrapalhadíssimo, o garoto começou a buscar o cantor por trás da vegetação.

Veja que tudo é azul
Em redor o bosque é anil
Sereno é o nosso lar
Mas o reino quem comanda é o vil
Mas o reino quem comanda é o vil

Contra perigos vamos lutar
Até a liberdade conquistar
Os que morrerem não farão à toa
Como lindos raios de sol ficarão à solta
Como lindos raios de sol ficarão à solta

– Pare com esse jogo de esconder! Pare de cantar essas charadas sem sentido! – gritou o rapazinho fora de si, desistindo de procurar.
A música cessou. A voz agora falou muito branda e educada.
– Preste mais atenção e verá que não me escondo.
 
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