O Despertar de Uma Canção



Joice Lourenço
O Despertar de Uma Canção
(Série Simplesmente Ame)



Capítulo 1

O passado ainda me amedrontava, mas eu seria forte, mesmo não sabendo como. Era o começo de uma  nova vida!

Hanna fechou os olhos, enquanto sentia aquela fragrância tão conhecida. Inspirava lentamente o ar, deixando que o vento bagunçasse seus cabelos, agora compridos. Era inexplicável a sensação que aquele toque exercia sobre ela. Era sinônimo de liberdade, algo que almejava havia muito tempo.
Três anos se passaram e esta era a primeira vez – depois de tudo o que aconteceu – que ela colocava seus pés naquela areia macia e tão conhecida. Há anos que lutava contra um passado e um trauma que não a deixavam viver plenamente.
No entanto, exatamente dois meses atrás, tomando uma coragem que não sabia de onde vinha, decidiu que estava na hora de enfrentar a si mesma. Não importava se iria doer ou o quanto poderia sentir-se desesperada. Apenas numa coisa tinha certeza: este era o seu lugar. Sua nova vida! E apesar de todos os medos que a perseguiram durante o trajeto de uma hora da casa de seus pais até aquela praia, sentia a paz que tanto almejava, a certeza de que pela primeira vez — em meses — estava fazendo a coisa certa. Mesmo sabendo que sua família e seus amigos não gostaram da ideia, sabia que era isso que tinha que fazer. Estava desesperada para dar um rumo em sua vida. Precisava voltar a viver novamente, e sabia que a praia do Ervino era o lugar escolhido pelo destino.
            Diante daquele mar imenso, do cheiro da maresia e do vento forte que a deixava com aquela sensação de liberdade, um som veio à sua memória. Era delicado. Nota por nota sendo inspirado por algo que estava além da compreensão. Não era qualquer tipo de som, era a melodia mais linda que já havia escutado. Tão pura e sublime que a fez se perder por alguns minutos. Parecia ser mais nítido, diferente das outras vezes que escutara aquela canção.
             Era estranho, quando menos imaginava e nos lugares mais improváveis, a música surgia em sua mente. Aquilo era confuso, Hanna não entendia. Mas a melodia era tão linda e profunda, que cada vez que sentia suas notas, apenas fechava os olhos e a escutava. Era como um bálsamo em sua vida, e um mistério que estava curiosa para desvendar. O que havia por trás daquela música? Por que ela a perseguia? Ou será que estava ficando louca? Era algo que estava além da sua compreensão.
            De repente, escutou algumas vozes, despertando-a de seus devaneios. Ficou estática, fechou os olhos e sentiu um tremor conhecido percorrer todas as veias de seu corpo. Seu coração começou a bater freneticamente e sentiu uma leve dormência em suas pernas e braços. Começou a sentir-se desesperada. Precisava se acalmar, tinha que agir de alguma forma. Tentou respirar fundo enquanto ligeiramente pegava o seu fiel companheiro, o spray de pimenta. Quando estava preparada para atacar quem quer que fosse, escutou o seu nome.
            Parou com o spray no ar, ficando atenta à voz que chamava pelo seu nome. O tom parecia conhecido. Tentou manter a calma mais uma vez, e, mesmo desconfiada, lentamente se virou, temendo quem estivesse ali. Mas, para sua surpresa e alívio, o que viu a fez abrir um enorme sorriso. Colocou a mão no coração, ainda se recuperando daqueles minutos intensos de desespero. Era a voz de sua amiga, que a chamava do outro lado da rua. Quanto tempo não os via!
            Camile e Daniel estavam atravessando a pequena rua, animados em vê-la depois de anos.
— Hanna! Senti sua falta! — Camile a abraçou fortemente.
Como era bom estar perto deles novamente! Assim que sua amiga saiu de seus braços, olhou para Daniel, que a encarava de uma maneira estranha. Aquilo a intrigou.
— O que é isso na sua mão? — ele indagou.
— Isso? — Ela apontou o spray de pimenta e o aproximou do rosto do amigo, apenas para provocá-lo, como costumava fazer antigamente. — É pra que nenhum homem se aproxime de mim.
— Principalmente você, Daniel — disse Camile, recordando da paixonite que ele teve por Hanna quando adolescentes. As amigas se fitaram e caíram na gargalhada. Como era bom estarem todos juntos outra vez!
            Quando se recomporam, Camile apresentou seu marido, que havia acabado de se juntar a eles.
             — Este é o Adriano.
            Hanna o cumprimentou seriamente, e apesar de ele sorrir um pouco, não mostrou tanta simpatia. Aquilo a pegou desprevenida, e antes que pudesse analisar mais a fundo aquele homem alto e estranho, voltou a atenção para a amiga, que não parava de falar.
— E tem mais uma pessoinha pra te apresentar. Vem comigo! — E pegou a mão da amiga, conduzindo-a para o outro lado da rua.
Alguns metros depois, entraram em outra rua, mais estreita. Hanna pôde aproveitar e visualizar algumas casas que conhecia. Estavam mais bonitas, algumas pareciam que tinham aumentado de tamanho. Havia outra, toda cercadinha, rodeada de flores. Achou linda, e exatamente naquela, sua amiga entrou, abrindo um pequeno portão. O que ela queria tanto lhe mostrar? Estava curiosa, devia ser algo muito importante para fazer todo aquele mistério.
Todos sorriam, trocando alguns comentários sobre como estavam as coisas na praia, mas ninguém falou sobre o porquê de estarem indo naquela casa. Pela lógica, devia ser a casa de Camile e Adriano. Será que era isso que ela queria mostrar? Se fosse, estava muito admirada com a casa. Era exatamente como a amiga sempre falava que seria. Pelo jeito ela estava conseguindo realizar todos os seus sonhos, diferente de Hanna, pois seu passado havia destruído completamente os seus sonhos.
Subiram por uma pequena escada e entraram após passar por uma varandinha com duas redes. A cara da Camile!, pensou Hanna, feliz pela amiga. Quando chegaram à sala, ficou ainda mais admirada. Era pequena, mas tudo muito delicado! Os móveis, os enfeites, até os pequenos quadros tornavam aquele ambiente muito aconchegante. No canto havia um sofá grande e marrom, e nele estava sentado um jovem que não conhecia. Segurava um bebê em seu colo. 
Camile abriu um sorriso enorme e pegou a criança. Depois, chegou perto de Hanna, e assim que ela sentiu a aproximação das duas, compreendeu o porquê daquela alegria. 
— É sua filha?! — Hanna ficou extasiada com a novidade, enquanto observava a bebê de apenas um ano, toda sorridente.
  Seu rosto era delicado e transmitia muita alegria. Não parava de sorrir para Hanna. Isso a deixou emocionada. Teve muita vontade de pegá-la no colo e beijá-la, mas no instante em que pensou em fazer isso, seus pés travaram. Inesperadamente as lembranças começaram a voltar, e numa fração de segundos sentiu novamente a dor de tudo o que passou.
Já fazia mais de três anos que havia perdido o seu bebê, e pensou que tivesse superado essa parte de sua vida. Ainda mais depois de passar tanto tempo ao lado da sua priminha Vitória. Entretanto, ao ver aquele anjinho, não entendeu o motivo, mas ficou estática.
Respira... Respira, Hanna!  Tentou se recompor, mas não conseguiu, era mais forte do que ela. Não estava entendendo aquilo tudo.
— Hanna... Hanna... — Camile a cutucou no ombro, tentando acordá-la daquele transe. — Você está bem?
Hanna finalmente voltou a si.
— Desculpe... Linda a sua menina... Olha, preciso ir. — Deu um sorriso sem graça, sentindo-se um pouco desnorteada.
Precisava sair imediatamente daquele lugar. Ar! Era o que precisava! Estava desesperada para respirar um pouco, fora daquele ambiente. Então, foi embora sem falar mais nada, deixando todos sem entenderem o seu comportamento.
***
            Andou o mais rápido que pôde até o seu carro. Trancou-se lá e deixou que as lágrimas amargas caíssem desesperadamente. Como odiava aqueles momentos. Sentiasse inútil e sufocada pelas lembranças constantes. Estava presa ao passado e as correntes pareciam não se quebrar nunca.
Depois de muito tempo, conseguiu se recompor. Respirou fundo, enxugando o restante das lágrimas. Ligou o carro e percorreu alguns metros até chegar à frente de um muro branco, ainda na rua principal da praia. Entrou num pequeno portão e estacionou. Àquela era a sua nova moradia. Já conhecia o lugar, e, pelo jeito, não havia mudado nada. Continuava lindo como sempre!
Pegou sua bolsa e uma mochila, e em passos rápidos passou pelo caminho de pedras — que ficava na frente das casas geminadas — até chegar à portaria. A única coisa que queria naquele momento eram as chaves de sua casa.
— Boa noite! Posso ajudar? — O porteiro a recepcionou, reconhecendo-a imediatamente. Ele apenas deu um leve sorriso. Hanna ficou imóvel por um momento. Sabia que seus olhos deviam estar inchados e sua cara péssima, mas antes que deixasse sua fraqueza aparecer, ignorou o fato de tê-lo visto na casa de Camile, há uma hora.
— Sou Hanna Caryn, a nova moradora do condomínio. — Mostrou seus documentos e, ele, no seu profissionalismo, pediu para que preenchesse um formulário. Como combinado, pagou os três primeiros meses. Após o recibo, ele lhe deu a chave.
— Obrigada! — disse com educação e virou as costas, andando pela calçada do condomínio, à procura do número 09. Para a sua alegria, ficava perto da portaria e do restaurante em que iria trabalhar. Achou perfeita a localização.
Quando destrancou a porta, percebeu que havia alguém atrás dela. Pegou o spray de pimenta na bolsa e estava se preparando para atacar, quando encontrou os olhos estreitos e assustados do jovem porteiro.
— Não sou o Daniel — disse seriamente, tentando não rir. Por um momento ela quase abriu um sorriso, mas não teve tempo, pois percebeu que ele havia entrado na casa. Não estava acreditando naquilo.
O porteiro começou a explicar tudo o que precisava saber sobre a casa e o condomínio. E não satisfeito, falou também em qual horário o sol batia na varanda e até sobre o mercado e a padaria mais próxima, dando um pequeno mapa da praia.
Hanna ficou de braços cruzados, encarando-o de maneira cética. Era muito abusado! Não via a hora de ele sair, no entanto, pelo que percebeu, ainda teria que aguentá-lo por mais um tempo.
Quem ele pensava que era para agir daquela maneira? Para quê todas aquelas informações? Não era criança, sabia exatamente como morar numa casa e conhecia muito bem a praia.
Antes que pudesse se irritar ainda mais com o sujeito, saiu da casa e foi buscar suas coisas no carro. Hanna percebeu que ele a estava seguindo, e isso a deixou ainda mais nervosa.  
— Faz parte do meu trabalho — explicou assim que a alcançou, percebendo o seu jeito.
— Mas eu não quero que você faça isso — enfatizou.
Estava tão irritada que não mediu as palavras. Seu coração acelerou mais que o normal e teve a sensação de que entraria em pânico. Não queria começar sua nova vida sendo grosseira com o jovem porteiro, o qual só estava fazendo o seu trabalho. Por que tudo estava se tornando tão difícil?
Tentou respirar fundo e concentrou-se em carregar sua mudança o mais rápido possível, para ficar livre daquele porteiro.
— Pronto! A última caixa — comentou o jovem, depois de alguns minutos carregando a mudança que estava no carro. Colocou tudo no chão da sala já mobiliada e encarou-a. — Qualquer coisa que precisar, é só falar comigo na portaria.
Naquele instante, Hanna estava bebendo um copo de água para tentar manter a calma. Sua mão estava tremendo, seu coração pulava mais rápido que o normal. Fez de tudo para disfarçar, mas não conseguiu.
O porteiro percebeu e se aproximou gentilmente.
— Você está bem?
Ela o olhou e respirou fundo.
 — Vou ficar, se você e todos os homens da face da Terra ficarem longe de mim.
O jovem ponderou por um momento. Não se sentiu ofendido, pelo contrário, ficou intrigado. O que aquela jovem tão bonita e sensível passou para agir daquela maneira?
Antes de deixá-la, encarou-a seriamente, suas palavras esbanjaram doçura.
 — Não sei o que aconteceu, mas sou um homem decente. Nunca te faria mal algum.
Hanna sentiu o impacto que aquelas palavras fizeram em suas emoções. Foi a primeira vez que escutou isso em sua vida. Perdeu-se por poucos segundos naqueles olhos verdes e sinceros que o jovem moreno carregava.


Gostou dessa pequena amostra? Então não perca tempo, e adquira seu exemplar. 
Clique nas opções:  COMPRAR | SKOOB



0 comentários:

Postar um comentário

Tecnologia do Blogger.